O impacto da IA generativa no suporte técnico: o que muda para TI
Por Edsel Simas, CTO da Setrion e da Milldesk Help Desk Software
O avanço da IA generativa nos ambientes corporativos está pressionando áreas historicamente operacionais a revisarem seus modelos de atuação. O service desk é um dos casos mais visíveis. A adoção de LLMs (Large Language Models) em fluxos de atendimento técnico alterou não apenas a jornada do usuário, mas a própria lógica de triagem, resolução e escalonamento de incidentes. O ponto central não é se a IA substitui o analista, mas sim como ela redesenha a arquitetura operacional e impõe novas exigências à equipe de suporte.
Diferentemente das ondas anteriores de automação, centradas em scripts estáticos e bots de interação linear, o que se vê agora é a incorporação de motores de linguagem capazes de interpretar, inferir e sugerir ações a partir de descrições ambíguas ou mal formuladas. Isso altera radicalmente o desenho de operação dos service desks, reposicionando o analista humano como um elo crítico entre o conhecimento técnico acumulado e os sistemas de inferência probabilística que passaram a mediar parte significativa do atendimento.
No plano tático, a introdução de IA generativa reconfigura o ciclo de vida de um chamado. A entrada, antes limitada a formulários predefinidos ou atendentes humanos, agora pode ser feita via linguagem natural, interpretada em tempo real por um modelo de linguagem treinado em tickets históricos, bases de conhecimento e logs operacionais.
A partir desse ponto, o sistema classifica o chamado, sugere prioridade com base em contexto, tais como frequência, impacto, criticidade, histórico de incidentes correlatos, e até propõe soluções com base em respostas anteriores — que podem ser automaticamente redigidas, testadas e enviadas ao usuário final, dependendo do grau de autonomia definido pela política interna. O analista não desaparece desse fluxo, mas passa a operar em outra instância: como validador, auditor e — mais importante — como modelador do próprio conhecimento que alimenta a IA.
Um novo campo de atuação para o atendimento humano
Esse deslocamento funcional exige uma requalificação estrutural do papel do analista. A lógica anterior, centrada na execução direta e no conhecimento operacional tácito, dá lugar a uma demanda por competências interpretativas e estruturantes. O analista precisa entender como a IA toma decisões, quais vieses podem comprometer a acurácia das sugestões, como os dados de entrada, sintéticos, ruidosos ou incompletos, afetam o resultado, e de que modo se controla a degradação de performance dos modelos com o tempo.
Esse novo perfil não é um luxo de empresas de ponta, mas uma resposta direta às pressões por redução de SLA e aumento da taxa de resolução de primeira linha. Em muitas operações, os tickets de baixa complexidade estão sendo inteiramente absorvidos por sistemas de IA. Isso tende a elevar artificialmente a complexidade média dos chamados restantes, o que, se não for devidamente interpretado pelas lideranças, pode dar a falsa impressão de queda de performance humana, quando na verdade é reflexo da filtragem automatizada.
É nesse ponto que o analista precisa ser mais do que um resolvedor de tickets: ele passa a ser um intérprete da própria estrutura do suporte, atuando na reconfiguração contínua dos fluxos, na calibragem dos modelos e na gestão ativa da base de conhecimento.
Curva de adoção no Brasil
No país, existem diferentes estágios de adoção dessas tecnologias. Enquanto grandes operações corporativas já testam copilotos de IA para auxiliar seus analistas em tempo real, sugerindo scripts, comandos ou diagnósticos com base em padrões extraídos de tickets anteriores, a maioria das empresas opera em um modelo híbrido, onde fluxos automatizados convivem com zonas manuais de contenção.
A questão central, porém, é menos tecnológica do que organizacional: a IA já está presente, mas o arcabouço de governança, curadoria de dados e capacitação técnica ainda engatinha. Isso gera uma tensão estrutural: a promessa de ganho de eficiência não se sustenta se a equipe humana não souber operar, validar e evoluir o sistema.
Outro ponto relevante é a forma como a IA responde às demandas. Modelos generativos operam por inferência estatística, ou seja, sugerem a resposta mais provável, não necessariamente a mais correta. Em ambientes de suporte técnico, onde a margem de erro pode comprometer a segurança da informação, a estabilidade do ambiente ou o atendimento a requisitos regulatórios, isso impõe a necessidade de filtros humanos qualificados.
A supervisão analítica passa a ser mandatória: o analista precisa saber identificar alucinações do modelo, respostas fora de escopo ou inferências equivocadas geradas por bases mal treinadas.
Essa supervisão, aliás, é parte de uma camada estratégica de operação que tende a se expandir. Na medida q em que a IA assume tarefas de baixa densidade cognitiva, o analista de suporte é puxado para camadas de decisão mais complexas, como a integração entre ferramentas de observabilidade e sistemas de resposta automática, a configuração de alertas preditivos com base em aprendizado contínuo, ou a definição de parâmetros de auto escalonamento.
O suporte técnico passa a ser, então, um nó crítico na cadeia de resiliência operacional das empresas. E o analista que se adapta a esse novo papel deixa de ser executor de tarefas e passa a ser curador de inteligência.
Em síntese, a IA generativa não representa uma ameaça ao trabalho humano no suporte técnico — mas impõe uma mudança de ordem. O modelo operacional se reconfigura, e com ele a exigência de novas habilidades, novas linguagens e novos modelos mentais. O analista que entender essa transição e assumir um papel ativo na arquitetura e curadoria dos sistemas inteligentes terá não apenas lugar garantido no novo ecossistema — mas protagonismo. Ignorar esse movimento é uma escolha que cobra um preço: o da irrelevância técnica em um setor onde a automação já deixou de ser promessa e se tornou infraestrutura.
Sobre a Setrion
Fundada em 2005, a Setrion Software é uma empresa catarinense especializada no desenvolvimento de soluções SaaS para atendimento ao cliente, help desk e gestão de workflows empresariais. Seu principal produto, Milldesk, é uma plataforma 100% nacional reconhecida pelo mercado por sua eficiência, inovação e aderência às melhores práticas ITIL.
Atendendo mais de 600 clientes no Brasil e América Latina, em segmentos variados como manufatura, farmacêutico, saúde, governo, tecnologia, serviços financeiros e educação, o Milldesk auxilia mais de 80 mil usuários mensais a otimizarem processos internos, gerenciando cerca de 1,6 milhão de notificações e mais de 125 mil solicitações a cada mês. Reconhecida nacionalmente pela excelência técnica e foco no cliente, a Setrion Software segue comprometida com o crescimento e inovação no mercado de tecnologia brasileiro.